QA XXX (P1)
26 Novembro - 14 Janeiro
Inauguração: 25 Novembro, 22 horas
Galeria Quadrado Azul | Lisboa
O panorama cultural português sempre sofreu de um problema endémico que se poderia definir enquanto uma estrutural tendência para as descontinuidades no seu devir.
Tanto ao nível das iniciativas privadas, como nas que emanam do poder político (autárquico e estatal), são recorrentes os projetos que abortam mesmo antes do seu nascimento e aqueles que resistem poucos anos de vida, por vicissitudes financeiras, caprichos ideológicos ou simples erosão no tempo.
Assim, quando uma galeria celebra o seu trigésimo aniversário, não podemos deixar de nos regozijar pela persistência que o seu mentor, Manuel Ulisses, tem vindo a demonstrar com tranquila eficácia.
Nascida no Porto, em 1986, a Galeria Quadrado Azul desempenha um papel fundamental no contexto das artes visuais nacionais. A abertura em 2006 de um espaço de exposição em Lisboa viria a sublinhar essa dimensão nacional. Por outro lado, uma continuada presença em feiras internacionais, nomeadamente na Arco Madrid, tem ajudado a dar visibilidade aos seus artistas num contexto de receção mais alargado.
Continuidade. Palavra-chave num percurso que foi evoluindo com rigor, sendo que na sua história se foi registando a passagem de um leque de artistas que em boa medida ajudou a definir o panorama criativo do final do século XX e ainda hoje o continua a fazer, com agregações de autores mais jovens, o que sempre foi uma das suas particularidades, isto é, a de saber trabalhar não só com autores consagrados, como também mantendo uma especial atenção a artistas em fase de afirmação.
Com uma relação muito particular com nomes como o de Fernando Lanhas, José de Guimarães, Ângelo de Sousa e Álvaro Lapa, a galeria demonstrava o acerto na escolha de artistas sem os quais a apreensão dos múltiplos caminhos da mais recente arte portuguesa ficaria incompleta. Já no início deste século, o trabalho continuado com Francisco Tropa e Paulo Nozolino, entre outros, reitera a acuidade de um olhar singular sobre o panorama atual, ao mesmo tempo que se ia empenhando numa renovação permanente, como o comprovam as incorporações de artistas como Hugo Canoilas, Ana Santos e Arlindo Silva, entre outros.
Refira-se também que na Galeria Quadrado Azul sempre se tentou a apresentação de artistas internacionais ao mercado português (foi aqui que se realizou a primeira exposição de Antoni Tàpies numa galeria comercial em Portugal), o que nos últimos anos ganhou maior fôlego, depois das passagens mais ou menos pontuais de artistas como a espanhola Susana Solano ou o alemão Robert Schad.
A celebração do trigésimo aniversário da Galeria Quadrado Azul vai-se desenrolar com a realização das exposições QAXXX (P1), em Lisboa, e QAXXX (P2) no Porto. Estas serão as exposições iniciais do trigésimo aniversário, sendo que em 2017 se realizarão mais duas exposições no Porto e Lisboa para fechar este ciclo comemorativo. Acresce que nessa altura será lançado um livro que documentará visual e criticamente a atividade da galeria.
Nas exposições que agora se apresentam em Lisboa e no Porto pode-se contemplar um conjunto de obras que fazem parte do acervo da galeria. Nessa seleção o espetador terá a oportunidade de rever (e nalguns casos ver pela primeira vez) obras que marcaram a sua história e, concomitantemente, entender o lugar especial que a Galeria Quadrado Azul ocupa no sistema das artes visuais nacionais, destacando-se a sua rigorosa e eficaz capacidade de juntar linguagens distintas sempre com um patamar de referência qualitativo muito elevado. A singularidade criativa dos artistas com os quais a galeria trabalha ou trabalhou permite uma visão curatorial de sentido dir-se-ia “institucional”, exatamente na medida em que os trabalhos agora dados a conhecer neste particular contexto, que vão da pintura à escultura, do desenho à instalação e aos livros de artista, se ancoram nos mais sólidos discursos formais e concetuais projetados na contemporaneidade artística.
Exercícios complexos, o processo de escolha das obras e as montagens das exposições, pretendem, acima de tudo, criar possibilidades de diálogos transitivos entre autores e afinidades discursivas que criem contextos de receção inesperados e enriquecedores.
Da urgência existencial às indagações mais formalistas, do questionamento político dos regimes de socialização estabelecidos aos posicionamentos irredutivelmente individualizados e auto-referentes, os territórios de pensamento plástico que emanam deste conjunto de trabalhos reiteram a absoluta pertinência da criação visual na redefinição de um olhar outro sobre o mundo.
Não apresentam soluções, não balizam juízos morais, não pretendem tratar o real como que suturando feridas abertas. Não se trata, aqui, de qualquer tipo de terapêutica. Trata-se, isso sim, da possibilidade de construção de um olhar criticamente avisado sobre aquilo que nos rodeia, no espaço físico e mental de sedimentos do passado, vivências do presente e narrativas do porvir.
Miguel von Hafe Pérez
Artistas presentes na exposição QAXXX (P1), Lisboa:
Alberto Carneiro, Álvaro Lapa, Ana Santos, Ângelo de Sousa, Arlindo Silva, Artur Barrio, Avelino Sá, Bruno Pacheco, Candice Lin, Carlos Vidal, Eduardo Matos, Fernando Lanhas, Francisco Tropa, Gonçalo Sena, Hugo Canoilas, Isabel Carvalho, Isabel Ribeiro, João Queiroz, Jorge Queiroz, José de Guimarães, José Pedro Croft, Paulo Nozolino, Renato Ferrão, Rigo.