2016.03.19—2016.04.30
Sim Zut
Pedro Tropa

Guglielmo Marconi, na sua velhice, acreditava que os sons do mundo nunca desapareceriam e que continuariam eternamente, em ondas sonoras progressivamente mais silenciosas. O ouvido humano não estaria apto para detectar estas frequências que se perderiam no tempo, mas nunca no espaço.
   
"Longe, mais longe,..." A linha horizontal cruza a linha vertical, tocam-se aqui para se distanciarem sempre mais. Assim compreendemos que os olhos nunca poderão ser moldura para a paisagem, ela vai além dos pontos cardeais e repete "longe, mais longe,…" O homem é apenas o eixo, a bússola que tem nas mãos. A antena procura o outro que, junto da sua antena, procura o outro. A paisagem comunica-se a outra paisagem, conta-nos as suas sinuosidades e os sulcos que a revolvem. Inicia-se o ritual que cura a ferida da distância. A antena acciona o movimento a partir da sua aparente imobilidade: desenha os 360º que a rodeiam e segue num movimento de ascensão. Mas esse movimento discónico a dois compassos não esquece a raiz que o mantém preso ao solo, e é a partir dessa raiz que lhe vem a ânsia da transmissão, sempre interrompida, imperfeita porque humana. A voz que se ouve do outro lado tem o nome da contingência e por vezes torna-se agreste, fere como a própria paisagem.
   
Ao vislumbrar o abrigo encontra-se o código da paisagem. Cada elemento é um ruído que se repete, porque também a paisagem é uma orquestra de repetições, como a semente se junta à semente para juntas melhor devorarem a terra. O ruído acontece na afirmação do acontecimento: acontecimento-árvore, acontecimento-pedra, acontecimento-terra. A melodia é atonal e o seu ritmo não nos pertence. O som desenha a paisagem. A paisagem desenha o som. A paisagem-ruído escuta-se com os pés que, sobre a terra, desenham novas linhas e seguem até onde a paisagem diz "eu não termino".

 
Sim Zut, (Vista da instalação), 2016 
A late evening in the future, 2016. Madeira de mogno, cartão, papel, pigmento, coluna de som, leitor mp3. 11,5 x 31 x 5 cm 
Sim Zut, (Vista da instalação), 2016 
Sim Zut, (Vista da instalação), 2016 
Sim Zut, (Vista da instalação), 2016 
Sem título, da série Sim Zut, 2016. Impressão em brometo de prata. 35,5 x 25 cm 
Cala-te lá!, 2016. Madeira de mogno, contraplacado, papel e cartão, coluna de ferro. 11,5 x 31 x 5 cm